O PAI PELO FILHO
JORGE ESCHER (*)
Em minha condição de pai do adolescente Rafael Freire Escher, que se afogou no lago artificial dia 03 de outubro último, esclareço que sua morte nada teve a ver com suicídio nem com drogas. Quem suicida-se se despe, ficando só de cueca, antes de saltar? Quem suicida-se consulta o pescador que se acha próximo do local em que ele pretende nadar, para dele saber se não atrapalharia sua pescaria nadando ali?
Meu filho fez essas duas coisas, deixando claro que não tinha a menor intenção de se matar, até porque andava animado com o novo celular e a nova cadeira de game que ganharia, os quais vinha escolhendo com calma, “para não se arrepender depois”, como ele me disse dias antes.
Andava animado também com a renovação de seu espaço na casa, a mesa azul que ganhara e as melhorias que ele mesmo havia feito na fiação de seus equipamentos, eliminando vários adaptadores. Quanto às drogas, meu filho fumava somente cigarro comum e maconha, e cada vez menos nos últimos dias.
Mas então, indagam-me as pessoas, por que seu filho saltou na comporta do lago duas vezes, a primeira em 15 de setembro e a segunda em 03 de outubro? Porque ele vinha sofrendo uma crise de TOC - Transtorno Obsessivo-Compulsivo -, uma ideia fixa que o levava até o lago para nele nadar como eu fazia em minha infância. Era um desafio, uma façanha que ele pretendia realizar. Evidentemente, somente chegamos a essa conclusão após a tragédia, amarrando inúmeras pontas soltas. Até então acreditávamos que Rafa, que vinha saindo para meditar durante a noite, como eu, aliás, fazia em minha adolescência e mesmo na idade adulta, havia sofrido um acidente dia 15 de setembro, escorregando e caindo na comporta. Sendo espírita, sei, porém, que sua obcecação em nadar no lago não era uma patologia somente, mas também fruto de uma obsessão, uma influência espiritual perniciosa, que, malgrado nossos esforços, não conseguimos neutralizar.
Não entro em outros detalhes sobre como tudo se passou com meu amado filho porque, para isto, eu teria de escrever um livro. Acresço apenas que Rafa era um menino bom, carinhoso, sensível, compassivo. Para se ter uma ideia disto, exemplifico com o episódio em que ele interagiu com o mendigo que pediu esmola à porta de casa, o qual convidou a entrar, ouviu atentamente sua história de vida e também as músicas que ele, o mendigo, cantou tocando o violão que Rafa lhe emprestara. Qual de nós convida mendigo a entrar em nossa casa e o trata como seu igual? Qual?
Jorge Escher, pai do Rafa.